segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Vale a pena LER de novo

O primeiro e sem dúvida um dos melhores textos do blog. Emocionem-se.
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Ao Tocar do Telefone

Toca o telefone. O silêncio é finalmente quebrado.

Levanto-me com calma da poltrona onde descansava ao som de uma rápida chuva após um longo dia de trabalho. O chá provavelmente já se esfriará; O relógio cuco no topo da parede marca onze horas em ponto. Uma imensa lua ilumina o céu e reflete sua luz branca no tapete do chão da sala.

Na estante, livros de romance policial degradados com o tempo e cobertos por uma fina camada de pó. Na parede, um quadro torto há muito tempo esquecido; A paisagem permanecia a mesma, mas os personagens não estavam mais ali.

Na caixa de correio, nenhuma correspondência se não cartas dos muitos bancos do qual sou cliente. A fachada desbotada e o jardim de grama alta evidenciam a idade da residência. Casa número 42; A última de uma longa rua sem saída.

Uma chuva trazia consigo o familiar cheiro de orvalho que perfumava a noite estrelada de verão.

No caminho vejo rapidamente a minha velha máquina de escrever (Até então desativada), a qual ocupa metade da mesa de centro, divide espaço apenas com os vários recortes de jornal e anotações manchadas por lágrimas de amor.

Lembrei-me que esquecei a janela do quarto superior aberta. O ranger da porta é de dar calafrios em qualquer um que ousa violar a velha porta de madeira para penetrar em um quarto separado do resto da casa.

Trajes e acessórios dos mais diferentes estilos e épocas evidenciam a idade de seu proprietário. Cuidadosamente colocados em Arcas de Carvalho, ainda guardam o mesmo aroma da juventude.

Desvio a minha atenção por um momento para o piano no centro. Há tempos já perderá a prática. Teriam sido apagadas todas as musicas de meu repertório? Quem sabe se o instrumento se esqueceu dos maravilhosos anos de ouro. Talvez os discos de LP perderam a graça, ou ainda as fitas no fundo da gaveta que se desgastaram antes da horário previsto.

Ao tocar do telefone, o chá já não tinha o mesmo gosto. O orvalho não tinha o mesmo cheiro. Ao tocar do telefone, nada mais fazia sentido na velha casa da Rua 7.

Um ar de mistério ainda circulava por entre os longos corredores do casarão. Uma dúvida guardada por sete chaves durante anos de expectativas estava prestes a ser esclarecida. Um único telefonema.

A esperança, até então adormecida na caixinha de música, retorna por alguns poucos segundos na medida em que me aproximo de uma resposta concreta.

Como o som de uma bala ao cortar o silêncio e a imensidão do deserto, o tocar do brilhante telefone vermelho traz consigo memórias de anos de festas e prazeres.

Tempos como esses não são de se jogar fora.

Ficam para sempre registrados involuntariamente em nossas mentes. Anos preciosos como um colar diamantes, mas que não se podem resumir no momento. Tempos de ouro duram bem mais do que se pode imaginar.

Pensamentos inundam minha mente numa fração de segundos.; A distância entre a cômoda é tão pequena, mas porque cargas d’água me ponho tão distante?!

Um minuto, igual a todos outros? Um minuto qualquer, não faz diferença alguma, é apenas mais um minuto no meio de tantos outros. É o mesmo minuto para todos no planeta.

Um minuto passa mais rápido do que se pode aproveitar. Mais rápido do que se pode perceber.

Atendo ao telefone.

Há muito tempo venho esperando por aquele minuto. Um único minuto.

E o que ouço?

André Torres

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